Aqui se faz, aqui se paga…
Autor: Mafalda ~ 29 de julho de 2010. Categorias: Ponto Gê.
Cansei de ouvir minha mãe, levantando os olhos do casaco de tricô que confeccionava para dizer aquela velha frase celebre e que serve de consolo quando alguém é desonesto conosco: ‘aqui se faz, aqui se paga minha filha’.
Apesar de não acreditar muito na vingança divina, isso sempre serviu como um prêmio de consolação para aquela amiga que roubou seu primeiro namoradinho de escola ou para aquela amiga devassa que te deu o maior corno da história. Ou para qualquer outra situação que saímos prejudicados e que não temos condições e nem crueldade suficiente no coração para uma vingança daquelas.
Em casos como esse, sempre temos aquela pequena esperança de que o Senhor Todo Poderoso em toda sua magnitude irá olhar por nós e fazer aquela vaca quebrar as duas pernas. Algumas vezes esperamos em vão, outras somos atendidos.
Mas e o dia que o feitiço vira contra o feiticeiro.
Um dia fui solteira, um dia não, boa parte da minha vida até o momento atual. Bom, isso não importa. O que quero dizer é que na alegria dessa solteirice eu adorava, mais a-do-ra-va mesmo, ser a última a sair do barzinho no final da noite e início da madrugada. Para toda ira de donos de restaurantes e garçons.
Mas, as coisas mudaram. E Deus resolveu rir na minha cara. Aquela frase dita pela mamãe, com voz doce e ar de superioridade, se tornou uma bela ironia. E agora começo a pensar que talvez a velha não falasse aquilo para me confortar e, sim, para me avisar. Já nem vejo aquele olhar de carinho, vejo uma cara cínica me avisando que um dia eu também ia arrancar um pedaço da língua. E Deus fez com que viesse a primavera. E junto com o inverno foi também a minha solteirice e veio um namorado proprietário de restaurante. E aqueles momentos divertidos com os amigos, aquelas madrugadas sendo a única mesa que restava no recinto, me sentindo a última gladiadora na arena se tornaram o meu pior pesadelo.
Agora sou eu a pessoa atrás do balcão desejando a morte de todos aqueles que não sabem a hora de partir, daqueles que não deixam nem um pingo de saudade, daqueles que me fazem desejar que um pedaço do forro caia na cabeça de alguém. São eles os responsáveis pela minha admiração e por me fazer assistir três vezes jogos mortais 1, 2, 3, 4, 5 e 6.
Se arrependimento matasse, eu estaria aqui morta no chão, desejando desculpar-me com cada garçom e dono de bar no qual fiz aguentar minha presença bêbada, pedindo as últimas cinco saideras, e ele esperando e suplicando um pingo de bom senso para poder ir embora, deitar em sua cama quentinha, ao lado da pessoa amada.
Mas ao invés disso, estou aqui, em uma quinta-feira, faltando alguns minutos para as 2 horas da madrugada, esperando que Deus ilumine a cabeça daquela última mesa e todos se levantem educadamente e caminhe em direção a saída.
Mas aqui se faz, aqui se paga… eles não vão embora tão cedo.
Amém
Beijos arrependidos
Gê